Monday, December 24, 2007

Cada lugar...

Eis que se adivinha o naufrágio de mais um ano... "Point no return"...
Um olhar cansado e esgueirado, na penumbra dos dias, relembra cada momento, de encanto, de carinho exarcebado, de deslumbramento inesquecível, e de tormenta, de feridas por cicatrizar, de lágrimas infindáveis, de jorro de dor...
Que trapézio terei oculto? Que dança na estrada me espera? Quantos malabarismos circunstanciais se me imporão? Com a mesma força de sempre, ou ainda mais, seguro este leme que é a minha vida...
" e uma vontade de rir nasce do fundo do ser
e uma vontade de ir, correr o mundo e partir
a vida é sempre a perder..."(*)

Ou talvez não!



(*) Xutos e Pontapés, Homem do Leme

Sunday, December 16, 2007

Sede

Sinto falta da escrita, de quando as palavras me iluminam os passos e a água de cada dia me acorda para um futuro inconstante. Interrogo as incongruências de que sou fiel depositária e nada... ora um coração vadio, ora uma razão turva... e nada outra vez e outra vez. A esperança é a minha bandeira, que continua a vibrar com o hino que o meu coração canta.
Também não deixarei de cantar, seja com às cavalitas do Pessoa ou nas entrelinhas de E. Andrade.
A sucessão de cada dia rumando ao indefinido, que tanto me atormenta, incomoda-me em demasia. O sucesso e o fracasso fecundam uma essência de todo irreconhecível. A necessidade de uma razão plausível para este grandiloquente nada aniquila cada lasca de racionalidade que ainda me sobra. Preciso de encontrar a linha ténue entre o nada e o tudo, preciso de aniquilar essa fronteira...e depois recordar cada palavra como parte de mim que é...e rasgar as nesgas de inutilidades que me poluem...

Saturday, September 29, 2007

"Os nós" que somos e o "nós" que temos


(seremos dignos da herança? oxalá...)

DO IMPÉRIO DO TER à quimera do ser

De tertúlia psicológica em (des)ilusão conterrânea, pousei uma vez mais no meu espaço de desvario contido.
No meu debate anjo/diabrura ou direitos/deveres ou até fidelidade/flirt acabo por descambar, a jusante, num rigoroso frente a frente ter/ser. E aqui, inquisidora de mim e de tantos que me rodeiam, tendo a questionar as primazias que se vão dando a nadas em detrimento de valores tão elevados que, por serem, poucos (ou nenhuns) são os que tentam içar-lhes as manápulas desgastadas. Não precisamos de invocar muitas imagens nem de dilacerar as nossas entourages à custa de platonismos repetidos. É a ideia em voga do aquecimento global e das energias renováveis, da reciclagem, e dos direitos humanos, dos pobres imigrantes ilegais e dos ricos portugueses recostados nos seus canudos de licenciados, e graduados em doutorices, sem reconhecimento, nem mérito, num mercado mordaz e em segregação de tudo e todos, qual Katrina focado na (des)economia do ser humano...
A triste ironia da realidade reside precisamente nesse marasmo da pseudo-formação /pseudo-exploração / pseudo-oportunidade, onde todos ficam boquiabertos quando ecoa da televisão uma voz que, em tom de lamuria excitada, proclama o desemprego da juventude e o número crescente dos imigrantes ilegais (esta será sempre, a meu ver uma questão deveras curiosa, uma vez que, tratando-se de ilegais, como se chega facilmente a números??, que tipo de contagem é feita??, qual o rigor da informação??, ou sabendo-se dessa ilegalidade, qual o motivo que leva os Estados a olvidarem estes seres que vivem à parte deles mesmos?? haverá assim tanta vantagem financeira?? qual o valor do capital humano??)... Os grandes capitalistas falam em investimento nas alternativas aos clássicos meios para trespassar a poluição e, concomitantemente, tirar proveito da consciência do "sangue novo" integrando-o num mercado laboral que, para periclitante, nada lhe falta...
E nós, os chamados jovens, recém-licenciados, futuro do país, irresponsáveis e amarrados aos pais até quase à pré-reforma? Quem somos, afinal? Somos de rês vária, é verdade. Há os que são irresponsáveis e vivem à sombra de algo que nunca foram e de vontades que não têm. Mas também os há trabalhadores, transparentes na amizade, grandiosos no ser e consequentemente tísicos no ter. Os que ainda vão acreditando que haverá um amanhã, que vale a pena, que talvez possamos ser irmãos de sonhos, mesmo quando olhamos para várias mãos descarnadas à custa da chapada desgastante que é o pesadelo.

Descendentes dum Velho do Restelo, ser-nos-á permitido cantar "Há uma primavera em cada vida: É preciso cantá-la assim florida, Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar!"?

Friday, August 17, 2007

Pensar-te

Pensar incomoda... O gotejar de cada dia num rol de dias sem fim, numa distância mensurável, mas angustiante. Pensar-te a milhas, mas perto de mim, numa incómoda sensação de felicidade antecipada, num mergulho de rosas (ou serão orquídeas)?
E o amanhã não me deixa incólume, ou as reticências temperadas com a dúvida, ou a ternura de um amanhã raiado pelo meu fio de prumo. Penso-te em cada esquina, em cada canto, em cada fugida a mim mesma. E quando não te penso, sinto-te, desfiando as contas do destino...

Sunday, July 15, 2007

Palavras reluzentes

Voltei a escrever. Transpiro inspiração. Brilham-me as palavras ao redor. Chamam por mim intensamente. Comungamos do sentimento uno, puro e indescritível da expressão, do dizer e do marcar o que tantas vezes é comodamente esquecido, num mercado negro de conveniências.
Vive-se num mercado negro de sentimentos, é um quem dá mais interessado e desinteressante, desleixado e mesquinho. É um comprar o que deverá agradar à vista alheia e um importar do que momentânea e materialisticamente encanta.
Valores mais altos [já não] se alevantam porque no "mercado negro" da vida já nem há valores, há estereótipos desgastados, moldes roçados, degradados....
Os que ainda acreditam desacreditam-se pelo que deles dão e desatinam pelo que nunca alcançam, insistem num "nada que é tudo" e colhem das pedras as sementes que para lá o vento levou, numa comiserada paciência extenuada.
Não evito o mercado negro. Vejo como se circula nele, escorro-lhe nas entrelinhas e já visitei o abismo.
Simplesmente acredito no reverso...

Eu nunca gostei de cantar

Ergue-se a minha tímida voz do túmulo que queria esquecido e canto... Sabias que eu nunca gostei de cantar?
Dos céus do encanto bebo o mundo, as estrelas e embriago-me em ti. E nesta embriaguez de sentidos e de pensamentos, encontro-me a sós contigo, naquele sigilo delicioso e tão nosso... é a tua voz que ecoa, melodia de uma comunhão com o que vida tem de mais belo.
É a vida no sonho. É a jangada para o nirvana. E depois, sentindo o aguilhão da "dor que desatina sem doer", deparo-me com a nudez do sentimento que canto ... e mais do que cantar para ti... canto-te a ti

Friday, June 22, 2007

Trilhando

É engraçado quando deixamos de gatinhar e, lentamente, vamos erguendo as nossas capacidades humanas. Por vezes, caímos de um pódio invisível, que, tresloucados, assumiramos como nosso... vastas feridas corroem -nos e depois o recomeço... Arrastamos os pés, abrigamo-nos na berma do precipício, lançamo-nos em sonhos ventosos. O pródigo esticar das asas será uma maravilha...que almejo roubar ao universo onírico...

Wednesday, June 20, 2007

Debaixo do tapete

Levantei o tapete da esperança. Por agora, pós... e uma luminosidade que há muito não via... Viva o Verão, viva a Humanidade, viva ...

Sunday, May 27, 2007

Intimista de binóculos

Noutro dia, não tão remoto como o nosso tradicional "era uma vez...", alguém que até agora muito prezo, apelidou-me intimista de binóculos, com uma interpretação que deixo ao critério de cada um, como essa pessoa deixou ao meu.
Neste meu intimismo progressivamente analista à distância, agora que deambulo diariamente pela capital deste nosso "à beira mar plantado", tenho vindo a deleitar-me com literaturas consuetudinárias, ou daquelas que jorram do "Metro" ou do "Destak", e que confluem nas nossas cabeças e fervilham como que no caldeirão do João Ratão. Num destes dias, lia precisamente num desses jornais gratuitos, que as nossas forças de segurança, deslocadas num desses destinos que nada têm de paradisíaco, e em exercício para a ONU, ficaram sem direito a férias, assim, sem qualquer justificação plausível. Repentinamente, espelhou-se na minha memória o que lera em "A filha do Capitão" de José Rodrigues dos Santos, sobre as férias sempre adiadas dos nossos paupérrimos soldados (ou será mais justo apelidar todos esses escalões de cabos "carne para canhão"?) em missão na Primeira Guerra Mundial. Ironia ou talvez não, ainda hoje os portugueses têm o mesmo destino, e na luta pelos direitos humanos, acabam por ser esquecidos alguns... os direitos daqueles que a incarnam...

Sunday, May 20, 2007

"Il faut porter en soi un chaos pour mettre au monde une étoile dansante." (Nietzsche)

Sou um caos e, no entanto, é nos intervalos desse caos que a vida é uma hecatombe... Chovem risos, acendem-se corações, incrementam-se sonhos e empolam-se idealismos. Isto é só o início da minha caótica indefinição. Depois, eu mesma, a de sempre, à parte os anos que me acrescentam, porque dizem que o tempo passa para todos, embora eu continue a jurar que o tempo só passa para quem deixa que a alma envelheça.
Caos à parte e nada sou, porque nesse caos encontro-me consciente ou inconscientemente contigo, sem que o saibamos. Deixo-te um beijo num envelope selado, pendurado na tua porta, e corro, fujo não sei de quê, no fundo talvez de ti, e talvez corra para os teus braços cantantes.
Não, não sou irreverente, sou uma mera malabarista, de circo em circo, de cena em cena...

Friday, May 11, 2007

como se fosse

Sugo cada compasso da vida como se fosse o penúltimo, respiro como se amanhã só pudesse respirar poucas mais vezes. Como é bom ter tempo para sentir a primavera florir, o roçar das flores na liberdade airosa de pétalas alheias. Já não faltas, porque nunca estiveste. Já não me lembro do roçar das rendas, nem do calvário das esperas nem daquelas noites ao relento lacrimejante na expectativa de um qualquer, mesmo escasso, sinal de fumo Já nem lembro se amavas ou se tudo não passou de uma mera casualidade circunstancial... Défices de memória à parte, prefiro sentir o que é meu, o que não é, o que possa vir a ser, o que nunca o será... porque "pensar é estar doente dos olhos" e amar é uma simulação constante de acidente...

Sunday, May 6, 2007

Ajudas a custo

Abaixo ao sensacionalismo, às dores de barriga, aos corações partidos.
Abaixo àquilo que dizes ser o amor... bah, quais eventos sociais, quais clubes de futebol, quais casórios fachada. Amar é lindo... e ser amada, já me passou pela cabeça, mas já não lembro se pelo coiro..

Saturday, May 5, 2007

...gosto de o ser



Trago no ventre o futuro e na memória o passado. No coração o amor para dar e no peito o alimento por tragar.
Porque gosto de ser... mulher!


Tu és a esperança, a madrugada.
Nasceste nas tardes de setembro,
quando a luz é perfeita e mais dourada,
e há uma fonte crescendo no silêncio
da boca mais sombria e mais fechada.

Para ti criei palavras sem sentido,
inventei brumas, lagos densos,
e deixei no ar braços suspensos
ao encontro da luz que anda contigo.

Tu és a esperança onde deponho
meus versos que não podem ser mais nada.
Esperança minha, onde meus olhos bebem,
fundo, como quem bebe a madrugada.



Eugénio de Andrade (1923 - 2005)
"As mãos e os frutos"

A malfeitora palavra

Há uma palavra, só uma, arredia, indecisa, malfeitora. Deixa-nos sempre na incerteza, oculta-nos milagres e transparece sonhos nublados. Apetece-me detestá-la, mas não posso, por constar do meu vocabulário diário e, pior, do daqueles que me rodeiam. Ela está em todo o lado, nos cigarros pendurados em lábios azulados, nas bocas desdentadas, nas bocas amareladas e até naqueles cérebros de ranhoca esverdeada onde o pensamento é estancado pela ardente corrupção e pela vontade de não o ter. Não se associa ao amanhã e muito menos é eleitora do ontem, mas estende-se a todas as urnas, embacia todas as rosas dos ventos e avaria todas as bússolas.
Como é que nós ainda nos deixamos empregá-la? Como somos descuidados, na desgarrada vocabular! Talvez nem seja de propósito ou até nunca tenhamos pensado nisso...

Tuesday, May 1, 2007

Meditações de frigorífico

Seria tão mais fácil abdicar desta racionalidade que só atormenta...ou deste coração que mais parece uma vítima da leis da gravidade, qual desconfortável maçã de Newton...
Sem amar nem pensar quão inocente e pura seria a vida, sem emoções exacerbadas, quão calma e suave... Imagine-se, como um passarito, voa no seu anonimato, na ingenuidade das tarefas mais básicas, não será feliz? Ou como o empertigado gato, mesmo com o fardo da gestão das suas sete vidas, se não tirará mais lucro desta vida.
Mas não, não fui digna dessa oportunidade que só aos escolhidos é atribuída. O meu fado é mais duro, mais intenso, mais ingrato...deram-me racionalidade (aquela incómoda capacidade de pensar nas coisas, mesmo naquelas que não me apetece e até naquelas que fazem parte de um futuro que nem sei se alcançarei...)...deram-me um coração (deve ser de uma marca registada muito particular, ou então um achado não digno de museu; tendencialmente aberto, mas sofredor; incómodo por se entregar e incómodo por errar por isso mesmo) e deram-me o sexo feminino (uff, e aqui, apesar dos progressos, ainda há muito por palmilhar, andamos na peugada das ideias e na sombra de passados que se acreditam conquistados...naifismos). Resta-me uma dignidade, tão pouco apreciada, contudo, meu alento diário, o amor às letras. Não tenho nada contra os números, em regra até temos diálogos mutuamente enriquecedores. Mas das letras, e do amor ao próximo que cada uma delas me transmite, não consigo abrir mão. São elas que me ilustram, quais tutores particulares... E, ironia das ironias, nada me garantem, os presságios acumulam-se... Qual mágoa por descobrir...

Sunday, April 29, 2007

Saturday, April 28, 2007

torpedos perdidos

Redenção. Talvez me tenha enganado. Existes, mas não te alcanço. O meu cérebro tomou uns laxantes, mas ainda uns neurónios mais persistentes insistem. Porque quiseste olhar-me nos olhos? Rastejo desde esse dia. Antes a quietude que a desilusão. Prefiro não te ter a ter-te perdido num dia de mortais dores de perder alguém. Perdi-me e perdi-te e voltei a perder-me porque te perdi, mas nunca perdi a esperança de amar como te amei, porque nunca deixei de te amar.
Escolho a dignidade à flatulência pessoal, a honestidade à gravitação financeira. Se escolhes comigo, seremos um só... ou seremos paralelos, como nunca fomos (e eis a verdadeira essência do drama)

...estas palavras

Hoje tenho a cabeça às voltas (é verdade que um pouco de álcool a faz fervilhar, mas esta coisa de ser sonhadora também influencia...) . Penso em ti a cada instante, o teu sorriso jorra de canto em canto, em cada fenda da minha vida, nas minhas alegrias e nas minhas lamurias. Seria tão mais fácil não me ter reencontrado, não ter trocado comigo mesma os rancores de sonhos ocultos. Apetece gritar que a culpa é tua, mas sei que nunca me ouvirás... Já não existes, porque tu és somente o meu sonho, é em mim e comigo que estás, sem mim não és sequer uma possível existência. E, no entanto, eu preciso de ti.
ERREI e trago comigo as enciclopédicas lições do erro. Quanto a ti, já não me importo, a tua história foi escrita na tua pele, invisivelmente tatuada. Contudo, eu leio essa tatuagem. Porque tu és o culpado de eu saber amar, porque tu és o culpado de eu querer sonhar, porque tu és o culpado de olhar para as sombras e querer reconhecer a pureza da luz que se esconde por detrás de cada uma delas.

Friday, April 27, 2007

...que não estás

Não é solidão o que sinto, não pode ser, é mais do que isso... Não há ninguém por cá... Há tanto que o(s) alguém(s) se confundem nas nubladas quimeras, há tanto que as vozes se perdem no meio dos sussurros da noite... Escuto o coaxar das rãs, debruço-me languidamente no parapeito da janela da realidade e ainda consigo, a custo, agarrar um pedaço de mim. E nesse preciso momento, tão preciso quanto rebelde e fugidio, aproximo-me desse entulho de faltas que me atormentam... O ar está estranhamento rarefeito por tantas "não presenças"... Falta-me aquela voz que exalava das paredes. Faltam-me as mãos que tocavam incessantemente as minhas. Falta-me aquele sorriso estranhamente contagiante. Falta-me a ternura do teu olhar. Falta-me a tua rebeldia. Falta-me a tua prontidão. Falta-me o teu entusiasmo. Falta-me o teu abraço. Falta-me a tua pieguice. Falta-me a tua preguiça. Faltas tu... Afinal, esta amargura é somente a tua longa e irreparável ausência...

...escrevo sem rédeas

São dois sorrisos, meia dúzia de dedos de conversa. Olhos postos no horizonte, a mochila às costas com as lições do passado. Ao lado, dois pares de óculos, dois livros, duas histórias cruzadas. A luz do amanhã continua indecisa, ténua e intermitente. Afinal, haverá mesmo o amanhã?
São as recordações (boas e más), os sonhos e os receios de novos pesadelos, e é aquele coração que bate lá dentro, insistente e envergonhado. Sob o signo do sigilo, os olhos cruzam-se e tornam a cruzar-se, mas negam-no, não vá a consciência alheia interpelar os desejos. Serão legítimos?
Terá a vida tempo para novas oportunidades? E depois é o interregno, é aquele tempo desconhecido, aquela noite que se prolongou e que agora é entrave à nova luz, é aquela vida que não pertence...
O tempo cibila, os óculos recolhem-se e a história continua, paralela. O coração aguarda pelo novo amanhecer, pelo raiar incólume do sol. Sigilo debaixo do braço, trocam-se as já pesadas mochilas. Nas mãos ainda jazem as rosas brancas mas no rosto já vai ancorado...o nosso sorriso...

Do Estagirita ao "orgulhosamente sós"

Discorrer sobre a sociedade, na insaciável procura do definição do que é e do que deveria ser ou, eventualmente, do que seria se vivessemos um ideal geral, é cada vez mais o tópico do momento. Opinar sobre utopias e realidades sem descartar, obviamente, lugares comuns como as taxas de juro e o desemprego ou o referendo ao aborto é tão indiscretamente fácil! Andamos todos a falar do mesmo, mas cada um é escudo dos seus próprios interesses. Convido-nos a fazer uma analepse embebida numa prolepse para que a análise não seja forjada, reiterando com antecedência que não sou historiadora nem tampouco socióloga; mas faço trabalho de campo todos os dias...
Dizia Aristóteles que o fim último do homem é a felicidade, alcançada quando o ser humano, por conseguinte, dotado de capacidade racional, realiza devidamente as suas tarefas na Polis. Hoje, de maneira diferente, é o "amor" o fim último, casa-se por amor, faz-se sexo por amor, protege-se o ambiente por amor, tem-se a conta bancária a zeros por amor, estuda-se por amor, mata-se por amor, etc, etc, sem que possamos esquecer o ter uma vida vazia por amor ou por necessidade de amar. Fazem-se viagens a destinos paradisíacos por amor ao próximo ou pela flatulência pessoal do querer mostrar à Polis que se consegue?
Efectivamente, tenho dúvidas de que sejam muitos os virtuosos, ou que reconheçam na vida da razão uma virtude. Todos somos assumidamente seres sociais, comparáveis a planetas no universo do "salve-se quem puder", seres sociais à nossa maneira, sem meio termo e sem ter em mente que alguém já o considerou, do "plus je fais l'amour, plus je fais la révolution" ao embarque ad infinitum numa qualquer causa, seja política, ambientalista ou teológica. Há quem leia nestas pertenças sociais que só assim se é um verdadeiro ser social, defensor do todo que somos, e que, irresponsáveis, cada vez mais muitos tendem a esquecer.
Não abdico da defesa de um cepticismo transversal, incólume até... cada um de nós cabe no(s) lugar(es) que as sociedades nos permitem. Hollywood pode até ser mais do que uma quimera, mas tudo o que o ser humano faz, tem sempre um qualquer interesse subjacente; é-me difícil admitir que há ainda quem deseje ser orientado pela razão, quem queira encontrar o justo-meio, usando, prudentemente, a riqueza, moderadamente os prazeres e conhecendo, correctamente, o que deve temer.
Enveredar por estes caminhos assaz tortuosos é sempre tarefa complicada. No entanto, depois de me terem sido gritadas aos ouvidos críticas ao "orgulhosamente sós" de alguém que pegou num país às costas, parece-me que hoje são mais que muitos os que olham, sós, para os seus umbigos e, reflectindo neles mesmos a degradação da Polis, nada lhe dedicam para além dos seus excessos ou defeitos. Mas o desígnio pessoal de cada um de nós, o que é?